terça-feira, julho 20, 2010

Centro de compras Paço Alfândega, Recife-PE

 De convento a centro de compras

O edifício em 1858, com as torres laterais mais altas, antes do incêndio

Por seu porte e história, o edifício do Paço Alfândega possui grande importância para Recife. Ele foi erguido ao lado da igreja da Madre de Deus, em 1720, para abrigar o convento dos padres da Ordem de São Felipe Néri. Pouco mais de cem anos depois, em 1826 , a Alfândega de Pernambuco foi transferida para o prédio, que passou por adaptações, concluídas em 1841 . Uma dessas mudanças foi a abertura da rua da Alfândega, que hoje separa a construção da igreja.

Em 1922 , o edifício sofreu um incêndio. A partir de 1932 , foi transferido para a Santa Casa de Misericórdia, que o alugou para diversos inquilinos, entre eles usineiros de açúcar, que adaptaram a edificação para utilizá-la como armazém. Nos últimos anos, totalmente degradado, o espaço era um estacionamento.
O Paço Alfândega ocupa a margem do rio Capibaribe; à esquerda está a catedral e à direita, o edifício-garagem.
O Paço Alfândega ocupa a margem do rio Capibaribe; à esquerda está a catedral e à direita, o edifício-garagem


Destinado às classes média e alta, o centro de compras Paço Alfândega promete ser a âncora da revitalização da porção sul da ilha do Recife, centro histórico da capital pernambucana.

Com usos anteriores diversos, como convento e armazém, o edifício foi construído em 1720 . E, agora adaptado por Carlos Fernando Pontual, faz parte de grande empreendimento dividido em quatro volumes, todos na margem do rio Capibaribe.

A transformação de prédios antigos em centros de compras é temática presente no Brasil - onde é exemplo o Shopping Light , de Carlos Faggin, em São Paulo - e em outros países, como o Pátio Bullrich , de Juan Carlos Lopez, em Buenos Aires.

Esse tipo de intervenção, bastante utilizada para revitalizar áreas degradadas, transita entre a preservação de elementos históricos fundamentais e o arranjo interno que viabilize o empreendimento.

No caso do Paço Alfândega, a mudança de uso de um edifício do século 18, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan), submeteu o projeto a uma série de exigências.

Prospecções arqueológicas e arquitetônicas (que se estenderam por mais de um ano) permitiram descobrir elementos das diversas etapas de existência da edificação (leia o quadro).

Como resultado, paredes originais desnudadas - apesar de tratar-se, historicamente, de edifício rebocado - pontuam o interior com trechos de alvenaria (de tijolos ou de pedra e tijolos) e revelam elementos do passado e da técnica construtiva.

“É uma aula de construção. As vergas possuem interessante desenho”, relata Carlos Fernando Pontual.

Como o volume ocupa uma quadra inteira, foi possível abrir quatro entradas, voltadas para faces diferentes. Os acessos no leste e no oeste rasgam a antiga alvenaria com um desenho “inusitado, uma caligrafia nova”, segundo o arquiteto. No entanto, mesmo ali manteve-se aparente o ritmo das janelas de antigas celas de convento.

A marca nítida dos locais de intervenção norteia todo o projeto, aproximando-se dos princípios da Carta de Veneza .

A estrutura interna é nova , uma vez que não mais existiam os velhos pavimentos em assoalho (que, de qualquer forma, seriam inadequados ao programa).

Pontual criou uma malha estrutural metálica independente da antiga alvenaria, mas, para “ buscar uma ordem arquitetônica ”, utilizou os mesmos eixos das arcadas sobreviventes. O aço foi escolhido por gerar menos impacto nos elementos preexistentes.


Iluminado pela cúpula, o átrio central preserva
arcadas do século 18

O terraço do terceiro andar é um mirante

Equipamentos do elevador panorâmico estão à mostra


Trechos da alvenaria existente dividem circulação e loja
O Paço Alfândega possui 82 lojas e quatro pisos. Os três primeiros são ocupados pelas unidades de comércio, com núcleo de serviços na porção sudeste do volume.

A distribuição segue a tipologia de centros de compras, alternando corredores e largos - o maior destes é o átrio central , que, ligeiramente deslocado para o sul, interliga espacialmente (com escadas rolantes e elevador panorâmico) todos os pavimentos.

Nesse grande vazio - que é o ponto de convergência do fluxo, segundo Pontual -, destacam-se a nova cúpula , que o ilumina, e a alvenaria antiga, com dois conjuntos de três arcadas sobrepostas. A praça de alimentação, no segundo andar, é o outro grande largo do conjunto.

O pé-direito mais alto do térreo possibilitou a criação de um andar técnico intermediário, no perímetro da construção. O Paço Alfândega liga-se ao edifício-garagem por meio de uma passarela no primeiro andar, que aproveita o vão de uma grande arcada construída para acesso de locomotiva e caminhões, na época em que o edifício foi depósito de açúcar.

“Colocar a ligação naquele local foi uma forma de evidenciar o acesso existente no passado. Antes havia um trilho no chão, agora vai haver outro no alto”, analisa Pontual.

O terceiro andar , por sua vez, possui cobertura plana, situada entre dois elementos preexistentes, mais altos e lineares, que ladeiam as porções norte e sul. A cúpula, que ilumina o vazio central, faz parte dessa cobertura.

Nesse piso estão três restaurantes e uma galeria de arte, circundados por um terraço de onde se pode visualizar o rio, a oeste, e o mar , a leste. Dessa forma, percebe-se o desenho da ilha do Recife, porção de terra onde nasceu a cidade.

O Paço Alfândega é parte de um empreendimento dividido em quatro volumes. Dois deles são edifícios de múltiplo uso projetados por Paulo Mendes da Rocha - garagens, centros de convenção e locais de eventos -, que estão em fase final de construção.

A quarta edificação é um exemplar eclético do final do século 19, cuja adaptação está a cargo de Luciana Menezes. O prédio abrigará, entre outros itens, oito salas de cinema, e está implantado ao norte do Paço Alfândega, logo após a igreja da Madre de Deus, catedral do Recife.



A estrutura metálica segue a modulação
das arcadas de alvenaria

Escadas rolantes e elevador panorâmico
interligam todos os pisos

Algumas lojas utilizam aberturas da alvenaria como vitrine
Texto resumido a partir de reportagemde Fernando Serapião
Publicada originalmente em PROJETO DESIGN - Edição 290 Abril de 2004 - 

Nenhum comentário:

Postar um comentário